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Literatura

A pirâmide sombria dos poderes: O que acontece quando se dá asas a cobras?

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Por Igor Horbach

Na última coluna nós refletimos um pouco sobre as análises que o livro “A Revolução dos Bichos” de George Orwell nos trás. Dessa vez, vamos continuar com ela, mas trazendo ainda mais para nosso contexto de realidade. 

Nos últimos dias fomos pegos de surpresa por um influencer que falou ao vivo sobre o fato do Brasil não ter uma liberdade constitucional para pensamentos nazistas. Pois é, por mais absurdo que isso pareça, ainda sim tem gente que acha que está tudo bem pensarmos assim. Como se não bastasse, ainda se apossa de um vitimismo balela após receber – obviamente – uma grande represália da massa cognitivamente capaz de pensar. 

O que venho colocar em tese aqui na verdade não é nem a questão de opinião, mas de comportamento e lugar da sociedade. Veja bem, Adolf Hitler foi responsável pela morte de aproximadamente 6 milhões de judeus quando dominou boa parte do continente europeu com seus princípios sociopolíticos. E fica mais chocante que a palavra ‘aproximadamente’ precise obrigatoriamente aparecer, pois não se tem um número exato. 

Já parou para pensar o que passava na cabeça de Hitler para matar tantas pessoas inocentes? Bom, é biologicamente impossível saber com exatidão, mas podemos observar alguns comportamentos e tirar conclusões paralelas. Hitler era um homem com sede de poder, como nos contam os historiadores, e acreditava fielmente que sua ‘raça’ – açoriana – tinha que prevalecer e que nesse caso, era necessário erradicar todos os ‘desviados’ ou ‘impuros’. 

Esse movimento de unilateralidade foi chamado de conservadorismo e se trata até de uma ampla discussão, posicionamentos e visões e ganhou força aos poucos na Europa, principalmente por feridas não curadas ainda da Primeira Guerra Mundial que acabou dizimando grande parte das populações dos países da União Europeia ou deixando-os em uma crise econômica e, portanto, social gigantesca. Com orgulhos feridos e a sede de vingança aumentando à medida que novas tecnologias nucleares vinham surgindo, o cenário estava perfeito para uma retaliação em massa. 

Ah, mas com certeza isso está longe de acontecer, né? Pois é, meus leitores, não está. É aí que você se engana. Foi com discursos menores como esse do tal influencer que Hitler foi ganhando espaço à medida que a cada frase suja, não ganhava uma punição por parte do Estado. Além do mais, já vemos nosso próprio ‘presidente’ saudar torturadores publicamente e sem remorso. Aliás, sabemos que ele mesmo foi responsável pelas centenas de mortes por COVID-19. 

Em um paralelo a discussão e a questão principal que trago aqui, retiro um trecho do artigo “Classes de Estímulo: Implicações para uma análise comportamental da cognição” de Júlio C. de Rose (Universidade Federal de São Carlos;1991): 

“Estes conceitos envolvem, basicamente, generalização no interior de uma classe e discriminação entre classes, sendo as classes determinadas, mais ou menos imperfeitamente, por certos atributos ou por valores de certos atributos. […] Os conceitos são geralmente organizados hierarquicamente, de tal modo que podemos fazer distinções mais refinadas entre exemplares de um conceito, através de conceitos subordinados.” (p.285)

Portanto, é meio óbvio que é muito mais fácil para uma pessoa como o tal influencer ou como o nosso suposto presidente defender ideologias controversas, já que estão em um lugar hierarquicamente privilegiadas. Quem está no topo da pirâmide da sociedade não consegue ver o que acontece na base porque está preocupado demais em se manter no topo. É um fato. As classes pré determinam seus valores e todos aqueles que a somatória final não seja favorável para a grande massa é colocada de lado através de discursos como esse. 

E o mais engraçado, embora trágico, disso tudo é que em quase 100% dos casos não são os ocupantes do topo da pirâmide que arrastam os “sem valores” para o canto, até porque é quando uma base esta forte, dificilmente o topo se abala, mas a retaliação sempre vem daqueles que ocupam os mesmos lugares. 

Veja bem, quantas pessoas assalariadas continuam apostando no atual governo mesmo sabendo que suas compras no mercado diminuem por uma gestão conflituosa, desorganizada e arrogante? Como já mencionado aqui, o topo é difícil de se manter, portanto, se o caos reina na base do triângulo, o nível de problemas no alto é drasticamente reduzido. 

Continuando ainda com o artigo de Júlio C. de Rose, vemos:

“Os conceitos são adquiridos pelos indivíduos ao longo de seu desenvolvimento, principalmente através da ação da comunidade verbal, que modela e refina as discriminações que as pessoas são capazes de fazer. É essa história que possibilita à pessoa conhecer o “seu mundo” de uma maneira característica.” (p.286)

Podemos ver claramente o perigo em disseminar discurso de ódio, não é mesmo? Faça um teste rápido agora mesmo e busque em sua memória quando conheceu alguém e que sua opinião foi claramente influenciada pelo discurso de uma terceira pessoa. Não precisamos ir longe para fazer isso, basta olharmos para o reality Big Brother Brasil da Rede Globo. A comunicação verbal dos participantes nos VTs de apresentações é o completo oposto de quem mostram ser de verdade, porém, quando o programa começa já temos aqueles mais empáticos com nossas personalidades simplesmente pelos seus discursos prévios. Imagine se cada vez mais assistimos na televisão ou nas redes sociais discursos de teor nazistas, extremistas e conservadores. Estaremos longe de um colapso social como o que a Alemanha e boa parte da Europa passou na metade do século XX? 

Para encerrar conecto todo o meu discurso nessa coluna com o livro do mês, de George Orwell onde os animais na Granja dos Bichos passam a odiar e inclusive caçar um dos líderes após uma série de mentiras e conceitos extremos que o segundo líder narra constantemente. Tudo o que é de ruim que acontece entre eles é justificado pelo líder que corrompeu-se e, consequentemente, toda a comunidade.  A partir daí, os próprios animais começam a caçar entre eles. Os porcos, que se mantém no poder desde a guerra contra os humanos no começo do livro, passam a ocupar os animais com trabalho de mão de obra 7 dias por semana para que não tenham força, nem tempo para questionar a divisão incorreta dos alimentos na granja ou o fato dos porcos pouco ajudarem na colheita e plantio. Já sabemos quem ocupava o topo dessa pirâmide sombria na granja dos bichos, não é mesmo? Mas sabemos quem ocupa o topo da nossa pirâmide?

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