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Teatro

“As Santas” e sua expulsão do paraíso

Publicado

em

por Carlos Canarin (@carloscanarin)

Estreou em março no Mini Guaíra o espetáculo “As Santas” da Cia à Curitibana Portátil de Teatro, que dá continuidade às produções teatrais do grupo após a estreia de “Os analfabetos” no ano passado. Dirigido por Adriano Petermann e com dramaturgia traduzida e adaptada por Silvia Chamecki a partir da obra do francês Jean Genet, a obra (que não tem nada de religiosa, apesar do nome satírico) se lança sobre as clássicas problemáticas de trabalho entre patrões e empregados, passando por temas como exploração, desigualdade e (por que não?) transformação.

Assim como a obra anterior do grupo, “As Santas” foca mais nas performances e no trabalho individual e coletivo do elenco. Não como virtuosismo e hermetismo, mas mais como, a partir do diálogo com o texto, a atriz e os atores conseguem encontrar variadas camadas de subjetividade. Não há muitos elementos cênicos no palco, e os que estão são utilizados pontualmente. A iluminação proposta por Lucas Tatarin é usual e fornece imagens interessantíssimas que, ao meu ver, poderiam ser ainda mais exploradas pela encenação, como por exemplo as composições que surgem a partir de reflexos.

O destaque da obra, para mim, vai para Heloísa Giovenardi e Diego Avelleda, que interpretam as irmãs empregadas da casa de Madame. Os dois estão super bem nos papéis que lhe foram dados e possuem grande troca e entrosamento em cena. Apesar de interpretar um papel feminino, penso que Diego não o faz buscando uma imagem pré-concebida imageticamente; isso mora apenas no figurino e no modo de tratamento entre as personagens. Ele não busca uma voz ou corpo estereotipados, e penso que isso nos traz outras nuances na sua interpretação. Nada santo, tudo muito demoníaco.

Penso que a presença de Danilo Avelleda, importante nome do teatro curitibano é uma homenagem muito bonita à sua trajetória. A entrada de sua personagem, a Madame, é uma construção muito inventiva, inesperada até se penso na estrutura da encenação mais realista. É como se a peça vazasse nesse momento para outro lugar, de devaneio, sonho, impossível – e como seria interessante se houvesse no espetáculo mais momentos como esse, de causar surpresa em quem está assistindo.

Somo a isso o fato de que a personagem de Avelleda sequer precisaria de fala, afinal sua presença enquanto personagem já é um acontecimento que comunica bastante. Em dados momentos, é evidente que o grande ator está lendo suas falas e, penso eu, quando entendemos que Danilo está o fazendo, acabamos por não mergulhar tão fundo como a peça nos pede desde o início. Ou incorpora-se a leitura como linguagem e jogo de cena, ou ela se torna uma quebra difícil de ser consertada e despercebida dentro da estrutura da encenação proposta por Pettermann.

Por fim, me dirijo ao texto dramatúrgico traduzido e adaptado por Chamecki, um texto dinâmico mas denso, com reviravoltas e aparências. É uma dramaturgia que serve bastante ao objetivo de focar principalmente na atuação, mas que não é rebuscada ou difícil de ser compreendida. É o tempo de planejamento de uma vingança, de orquestração de um plano dentro de uma mansão, que é o único cenário existente dentro da ação dramática. É também a vontade de querer ser aquilo e quem que te oprime, a gana por um dia conseguir experimentar o poder em seus mais variados sabores.

Crédito foto: Orestes Jorge ( Suricatta Produções Culturais)

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