Teatro
O Traidor e o teatro do absurdo de Gerald Thomas
por Vanessa R Ricardo @vanessariricardo
Marco Nanini está no grande palco do Teatro Guaíra. Sobre o linóleo vermelho, ruínas e um boneco gigante com feição dele amarrado no chão, criado por Fernando Passetti, com o qual o ator faz uma única interação, pois não quer olhar, não consegue, diz ser muito fake.
Com dramaturgia e direção de Gerald Thomas, o espetáculo não tem como objetivo contar uma história de começo, meio e fim. Na verdade ele é um espelho da falta de sentido da existência humana. Um espetáculo niilista eu diria.
Traidor marca o retorno após 18 anos da primeira parceria entre Gerald e Nanini, que em 2005 estrearam o espetáculo “Um Circo de Rins e Fígados”. E no novo trabalho, o diretor-dramaturgo e Marco Nanini trazem para a cena referências ao primeiro trabalho, e também ao penúltimo do diretor, G.A.L.A, que está presente nos offs gravados pela atriz Fabiana Gugli.
O espetáculo traz para cena um homem isolado em uma ilha, ou na sua própria consciência, cercado por destroços. Estaria ele caminhando pelos nove círculos do sofrimento como Dante Alighieri na Divina Comédia?
Seria essa ilha também a nossa relação com as redes sociais? Tudo está a um toque dos nossos dedos. Informações e imagens que passam feed acima sem aprofundar nada, consequências da contemporaneidade. Tudo não passa de fragmentos. Ou seria um homem em uma profunda solidão?
Traidor traz um discurso, uma dramaturgia fragmentada, que fala sobre as tristezas e inconsciências humanas. O personagem está em estado de delírio, dialogando consigo mesmo, em um fluxo de consciência. O quase solo conta ainda com a presença dos atores Apollo Faria, Hugo Lobo, Marllon Fortunato e Wallace Lau, e que trazem para o teatro do absurdo de Gerald Thomas imagens oníricas. Traidor é subverter o fazer teatral. É a anti dramaturgia.
Traidor debocha de tudo, das guerras, das pandemias, da vida e do próprio teatro. Faz chacota com a vida contemporânea, diante das redes sociais. O personagem se mostra cansado, exausto, virou refém. Não faz mais ovo frito sem consultar um tutorial de gastronomia no Youtube. Nanini se veste de palhaço, com uma linguiça na mão em um quadro de um programa de televisão improvisado, mostrando a manipulação da indústria do entretenimento.
O “Traidor” traz aos amantes do teatro a possibilidade de ver a potência que é Marco Nanini, mas para quem esperava ver o ator global que por quase 14 anos interpretou Lineu na Grande Família, talvez tenha se decepcionado. Gerald Thomas e seu fazer teatral faz às avessas o teatrão, gera desconforto principalmente para aqueles que buscam uma história linear de começo, meio e fim.
O espetáculo conta com direção, dramaturgia e concepção visual de Gerald Thomas; Elenco Marco Nanini, acompanhado pelos atores Apollo Faria, Hugo Lobo, Marllon Fortunato e Wallace Lau. Iluminação de Wagner Pinto; Cenografia assinada por Fernando Passetti; Figurino por Antonio Guedes; Direção musical e trilha sonora por Alê Martins; Direção de movimento Dani Lima; Assistente de direção de Samuel Kavalerski; Direção de produção Fernando Libonatti e Coordenação de produção de Carolina Tavares.