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Cafés Malditos traz o que um bom teatro curitibano é capaz de fazer

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Por Igor Horbach

O Teatro Curitibano se destaca por inúmeros motivos legítimos, entre eles por textos que dialogam com o espectador e experiências artísticas que propõe aos espectadores. Cafés Malditos do grupo Alameda Teatral que estreou uma semana antes do Festival de Curitiba, mas faz parte da mostra Fringe, é autentico em sua forma de se relacionar com o público presente.

Rute é uma clássica mãe brasileira que cuida de absolutamente tudo para sua família. Desde encher as formas de gelo até a organização das festas de fim de ano. Mas ela não aguenta mais. Rute está cansada. Então decide planejar seu próprio velório. Somente desta forma, terá uma despedida digna e organizada. Ela chama a família e amigos. Todos aceitam, como sempre aceitaram suas regras. Rute inicia o ensaio de seu velório com a esperança de finalmente conquistar o descanso eterno. O problema é que, às vezes, nem tudo sai conforme planejado. É o que nos conta a sinopse oficial do espetáculo.

De antemão, a cenografia pelo experiente Paulo Vinicius é impecável, minimalista que transporta o espectador para dentro da cena. Ao centro do palco há o altar que cumpre o papel do caixão com um quadro da “vítima” pendurado ao fundo. Mas o que mais chama atenção talvez seja o dialogo harmônico que todos os objetos cênicos e estruturas da cenografia estabelecem ao longo da narrativa.

A trilha sonora que começa já na recepção teatral que o grupo proporciona – o qual falaremos mais tarde – e durante todo o espetáculo é atual, embora batida no caso de Thriller de Michael Jackson. Traz exatamente a comicidade que as cenas precisam para tratar de um texto profundo, embora nitidamente não seja a intensão declarada do mesmo. O que faz até mesmo Michael Jackson ser necessário e uma escolha perfeita para a cena.

A atuação do elenco é impecável, brinca com os momentos de tensão e leveza com tal maestria que se torna anos luz a frente do naturalismo e da verossimilhança. Os jogos cênicos que conversam diretamente com a plateia, propostos pelo elenco envolve o público e os torna convidados íntimos da família. É como se todos fizéssemos parte daquilo e os conhecesse há muito tempo.

O texto de Amande Macedo é profundo com doses cômicas na medida certa. É impossível sair do espetáculo sem ter dado muitas gargalhadas, ao mesmo tempo que nos propõe uma reflexão crítica sobre a vida, os rituais que nos permeiam em relação a morte e principalmente nos traz o que é de “praste” na cultura: a identificação, além da ressignificação do papel feminino no âmbito familiar. Todos conhecemos famílias – se não a nossa – que fariam ensaios para os próprios velórios e que acabariam em uma grande confusão de “lavagem de roupa suja”.

A iluminação de Nádia Luciani também merece destaque para sua harmonia com o conjunto da obra. Os pontos de foco que se alternam de acordo com cada momento e a forma como a cor muda conforme a passagem textual do elenco é admirável.

Enquanto que a direção se preocupa em tornar tudo harmônico, homogêneo e ao mesmo natural. Não no sentido teatral (estética naturalista), mas natural de existência e composição. Em outras palavras, Max Reinert brinca com todos os elementos e técnicas que compõe o teatro, sem excitar, sabendo que o resultado final seria impecável.

 

RECEPÇÃO TEATRAL

Um âmbito ainda pouco explorado pelos coletivos teatrais, mas que tem ganhado destaque nos últimos tempos é a recepção teatral, que se prova fundamental em um espetáculo. É o basta necessário para a quarta parede que algumas peças ainda insistem em construir. O público está ali, presente o tempo todo.

No caso de Cafés Malditos, merece grande destaque principalmente pela subjetividade que se esclarece ao final de tudo. Quando as portas do teatro se abrem, somos recepcionados pela protagonista, como convidados de um grande evento de gala e repleto de etiqueta. O aroma de café sendo passado na hora preenche todo o ambiente, trazendo uma vivencia única. Logo no início da peça, o elenco nos serve de salgadinhos para que sejamos acolhidos. Ao longo da peça, os próprios voltam a servir a comida e agora com o café fresquinho. Tudo se torna especial e marcante.

 

Sem dúvidas, Cafés Malditos é um espetáculo que precisa ser visto por aqueles que querem vivenciar o teatro curitibano em sua forma mais bela e pura. Rompe completamente com a ideia repugnante do teatro “que ninguém entende”, mesmo tratando-se de um tema profundo e que poderia ter caído facilmente em monólogos reflexivos entediantes, mas é dirigido belissimamente para outros caminhos.

 

SERVIÇO:

Cafés Malditos

Onde: Teatro Enio Carvalho (R. Mateus Leme, 990, Centro Cívico, Curitiba –PR)

Quando: FRINGE – 05 e 06 de abril às 20h | Temporada independente: Até 06 de maio, de quinta a sábado às 20h e domingos às 19h

Quanto: De graça (necessário retirar ingresso 30 minutos antes)

 

A Direção é de Max Reinert, dramaturgia de Amande Macedo, iluminação de Nadia Luciani, figurino e cenografia de Paulo Vinicius, maquiagem de Cristóvão de Oliveira, assistente de produção de Rafael Menezes e produção de Galvani Junior. O elenco conta com Simone Klein, Cristóvão de Oliveira, Daphne Garcez, Heleno Rohn, Vanessa Strelow, Jeff Franco, Leandro Oliveira e música de Ariel Rodrigues. Espetáculo realizado por Alameda Teatral.

 

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