Teatro
O Figurante – Mateus Solano realiza atuação de fôlego, morre na coxia e deixa tudo no palco
por Leonardo Talarico
O pensador russo BAKHTIN ressalta a importância nas obras de arte da junção entre o cômico e o trágico. E o espetáculo “O Figurante” realiza a referida lição. Lugar comum haver plateias resistentes ao sofrimento. O Teatro, neste diapasão, serve para escapar das mazelas cotidianas. Mas a função biográfica-estrutural do Teatro é bem mais larga. Escolhas como “O Figurante” auxiliam na recolocação do Teatro (e da própria comédia) no seu devido posto.
A direção do espetáculo aproveita a expectativa criada no público pelo atual cenário teatral cômico da risada solta, da menor comédia, da eliminação das personagens, para entrelaçar cirurgicamente o “público-distraído” em uma carga dramática relevante e com pitadas políticas explícitas (sem poupar o próprio endereço). Tudo no melhor estilo: o drama pertence as categorias de poder e a comédia as esferas populares. A dramaturgia é escorreita, complexa e muito bem trançada. A direção conta muito bem a história, realiza um Teatro de Ator e dispensa todo lixo cênico. Cenário e adereçamentos estão na contundente representação de Mateus Solano. Nele surgem todas as imagens e se estabelece o jogo cênico. Sobretudo, no minucioso trabalho corporal (total artes).
A direção de movimento e a intensidade na interpretação mantêm a pulsação vibrante e a passagem fluída do espetáculo. O figurino é competente, veste o ator com bom corte e agrega valor dramático. É roupa cênica. O desenho de luz é também muito bem realizado e operado disposto a revelar localizações e acentuar a dramaticidade das personagens (real e imaginárias). A eficiente “trilha sonora” está a serviço da obra e resta muito bem operada. Efetivo cenário e atmosfera “auditivas”. Outro destaque da direção é trazer todos os saberes teatrais a serviço da peça. Mateus Solano realiza atuação de fôlego, morre na coxia e deixa tudo no palco. A interessante história caminha sem tropeços, provoca risos de diversas camadas e impacta nas revelações dramáticas. Uma obra que faz rir para inserir dor e reflexão. Parabéns a todos os envolvidos.