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Literatura

O Comboio das três

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Texto de Ariel Menon

Ontem a noite sonhei com você. Olhava para mim da rua, pela janela do ônibus.
Lembrei da raiva que sentia antes, quando disse que não queria nada comigo. Lembrei da dor de dar adeus e de como me revoltava por isso.
Já você… Sorria! Ousado, fazia descaso de mim. Eu não parecia ameaçadora?
Não.
Agora éramos nós dois – puros e livres de espírito. Eu, diante de um sorriso, um sorriso tão espontâneo, tão vivo, vi meus planos sangrentos de vingança se desarmando todos de uma vez. Era possível?
Sim era, já havia dado tempo de odiar outro, acusar-lhe de mil e uma infâmias. Teus pecados foram perdoados pela bondade do tempo.
Na hora julguei que você não tivesse gostado do meu novo corte de cabelo, por isso ria de deboche.
Pensei melhor e talvez só estivesse sorrindo por que não acreditou que fosse me ver outra vez um dia e agora estava feliz por isso.
Achei otimista demais e preferi ficar com a primeira opção.
A verdade é que superei seu desamor, já que o amor nunca precisará ser superado. Ele é absorvido e torna-se degrau na construção do eu.
Ao meu passado detenho a possibilidade de ter rancor de ti e por enquanto, permaneço renovada, pronta para qualquer experiência que se proponha a cruzar meus caminhos. Isso assusta, mas não sou mais tão jovem e sei lidar com o inesperado (é o que julgo estar correto).
A passagem dos dias te inocentou no tribunal da minha mente. Ou será que apenas esqueci que estava chateada?
Lamento não poder ter permanecido (apesar de ter sido você quem me rejeitou), de qualquer forma sou um amontoado de lembranças. Não passam disso, lembranças! Se desvanecendo na bruma da imensidão desse espaço, criado para todos nós, humanos.
Ando em busca de um homem com sua sutileza, que dessa vez não me machuque. Pelo amor de Deus.
É raro não encontrar-se com o acaso nas teias do todo e mesmo místico demais para ser aceito, é verdade. Eu o amo, eu o amo verdadeiramente como nunca pude amar antes pois estava cega, gorda de ego que era.
Agora espero o comboio das três, ao lado de uma velha amiga. Há uma esperança de encontrá-lo, ainda que desiludida. Há uma expectativa de o ter profetizado.
Não aconteceu. No mais, obrigada. Deve ter sido o fato de que sempre preferi andar de trem.

Desenho de João Emanoel Fidelis

SOBRE O AUTOR
Ariel Menon
Escritor amador, ator e tarólogo. Nasceu em Curitiba (PR), começando a escrever contos e crônicas aos sete anos de idade.

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