Música
CONEXÃO CULTURAL – Karol de Curitiba com “C”
Por Bianca Nascimento
Do BBB, a gente já sabe o “bafafá”: começa com K! O que muitos paranaenses não sabiam é que Karol Conká é de Curitiba. No reality da casa mais vigiada do Brasil, a rapper declarou, em uma fala, claramente xenofóbica, que, por ser de Curitiba, tem muita educação para falar com as pessoas. Como brincou nosso humorista paranaense Afonso Padilha, durante uma apresentação de comédia: os artistas que saem do Paraná vivem tentando mudar a imagem que curitibano é metido, e aí, entra a Karol no BBB falando que é curitibana. “Pracabá”!
Brincadeiras à parte, sabemos que a situação da artista curitibana mais cancelada do Brasil, visivelmente, não está nada boa: Karol Conká vem sendo “cancelada” também de vários trabalhos e shows, como no evento Rock the Mountain, que anunciou que ela não irá se apresentar na edição de 2021.
A gente sabe que a guria passou por muita coisa na vida. Veio de uma família humilde de Curitiba, participou e ganhou diversos concursos de danças e rap. E não duvido nada que tenha passado por muito preconceito na sua trajetória, em uma cidade e país que não valorizam como deveriam a cena do rap e hip hop, uma arte que transforma a vida de muitos jovens. E particularmente, numa cidade que só valoriza o seu artista quando faz sucesso fora.
Fato é que Karol Conká conquistou milhares de fãs pelo Brasil, principalmente, por suas mensagens de respeito, empoderamento e militância. E é exatamente esse o ponto da ferida. Minha reflexão hoje parte desse viés: a decepção coletiva que vivemos sobre um artista. É duro ver um ídolo envolvido em crimes, confusão, e sair do lugar de referência.
Foi um choque de realidade ver Karol Conká, tão conhecida por causas sociais, envolvida em cenas de xenofobia, abuso e racismo. Estamos assistindo uma pessoa montada artisticamente, mas que também precisa ser trabalhada psicologicamente, assim como todos nós.
Nenhum fã ou telespectador certamente exigia perfeição. Embora cobremos isso, inconscientemente, dos nossos ídolos. Mas, esperavam o mínimo das bandeiras que sustentam a carreira da Karol. Queríamos nos inspirar com ela, queríamos que ela desse um tapa bem dado na cara da sociedade. Vemos agora alguém que certamente já foi muito oprimida, tomando em vários momentos, o lugar do opressor.
Esse choque de realidade veio também para uma reflexão coletiva, em um país ainda muito conservador como o Brasil. E que mesmo que por um programa como o BBB, tem assistido e se confrontado com cenas de abuso tão comuns, cometidas no dia a dia dentro das famílias, em ambiente de trabalho e em tantos outros meios.
A psicologia explica, não justifica, e a sociedade não perdoa mais. Por outro lado, há de se ter também muita cautela. Jorge , o filho da Karol Conká, desabafou em suas redes sociais que tem sofrido ameaças e ataques, e pediu mais empatia do público.
É revoltante tudo isso, mas devemos exercer com sabedoria a política do cancelamento. Devemos sim cancelar, com C, com K, ou qualquer outra letra, todo e qualquer tipo de crime. Mas, cancelar Karol Conká ou qualquer outro ato de barbaridade, não pode ser uma uma ação baseada e compactuando com as ameaças de morte, agressão e incitações de ódio e com perseguição.
Bianca Nascimento
Jornalista, atriz, nômade. Em sua jornada na arte e jornalismo, Bianca Nascimento esteve à frente da assessoria de imprensa de projetos culturais em Curitiba e na comunicação da Secretaria da Cultura do Paraná. Sua alma nômade já a levou para a África do Sul, onde morou e trabalhou com marketing na área de intercâmbio. Agora, há dois anos morando no Rio de Janeiro, onde já se aventurou como atriz em teatro de comédia e musical, traz para o Jornal A Cena, literalmente, as novidades da cena cultural do Brasil para Curitiba e de Curitiba para fora.