Interaja conosco

Colunista

Como The Crown pode impactar na monarquia britânica

Publicado

em

A nova temporada da série está mais dramática do que nunca e mostra a fragilidade da Coroa desde da década de 90

Por Igor Horbach

O Reino Unido é uma das grandes potências econômicas mundiais, principalmente pelo Império Britânico (1600 – 1997). Boa parte desse poder econômico se deve também pelas Revoluções Industriais que surgiram nos territórios ingleses. A Coroa Britânica está entre as mais ousadas, violentas e poderosas de toda a história da humanidade, já que foi a responsável pela conquista territorial de mais de 35 milhões de Km2 no apogeu das forças armadas, por volta de 1919 após o Tratado de Versalhes nas mãos do Rei Jorge V. Para se ter ideia, isso correspondia a 24% de todo território do planeta. 

Porém, para compreendermos melhor a monarquia Britânica, sua força mundial e como uma série de tv pode impactar em sua imagem pública e domínios políticos atuais, é necessário voltarmos um pouco no tempo. 

A história da Monarquia Britânica

Guerra das Duas Rosas

Os primeiros indícios do Reino da Inglaterra datam de 927 d.c. até que se tornasse o Reino Unido da Grã-Bretanha, séculos depois. Antes disso, de 1337 a 1453 ocorreu a Guerra de Cem Anos quando a Inglaterra foi derrotada pela França. Até então, não existia o Reino Unido e nem mesmo o Império Britânico, que foram peças importantes nesse jogo de xadrez. De 1455 a 1487 ocorreu a Guerra das Duas Rosas, um importante momento para a história inglesa, quando o conflito entre as famílias Iorques e Lancaster ocorreu, o que serviu de inspiração para o autor norte-americano George Martin criar a saga As Crônicas de Gelo e Fogo (mais conhecida como Game of Thrones). Contudo, a guerra resultou na ascensão de Henrique, da dinastia Tudor ao poder.  

No século XVII, em 1651, através da Revolução Gloriosa, a Inglaterra se tornou uma república quando derrubou a dinastia Stuart do poder. Contudo isso não durou muito e em 1661, Carlos II e Jaime II restauraram a monarquia e fizeram da Inglaterra um reino novamente. Ambos da dinastia Stuart. Por sua vez, Jaime II foi ousado demais e tentou governar diretamente nas decisões políticas e foi barrado brutalmente pelo Parlamento Inglês, ao ponto que perdeu a Coroa durante a revolução. Em 1689, Guilherme III foi proclamado rei da Inglaterra e nesse ano assinou o Bill of Right (Declaração de Direitos) fazendo surgir então, a Monarquia Constitucional que perdura até os dias de hoje. A partir desse momento, a Coroa é definida apenas como Chefe de Estado, tendo o poder de convocar o Parlamento, sancionar leis, nomear ministros (mera formalidade, uma vez que os ministros são eleitos democraticamente) e comandar as forças armadas. Contudo, nessa época, o monarca ainda continuava com uma peça muito importante que o atual Rei Charles III não tem: poder de influência. 

Isso porque na época, mesmo que houvesse o movimento republicano na Inglaterra, o resto do mundo ainda se via sob domínios monárquicos, o que ajudava a fortalecer as influências e imagem pública dos reis e rainhas ingleses diante de seus súditos.

 

O Império Britânico e a influência para a sociedade mundial

Mapa do Império Britânico

O Império Britânico, como ficou conhecido o poder das forças armadas da Inglaterra na História da humanidade, foi um grande movimento colonialista seguido por séculos e passando nas mãos de vários reis e rainhas. O seu único papel importante de fato foi no da exploração terrestre e marítima, o que tornou possível descobrirmos o globo terrestre da maneira que conhecemos hoje. 

Por outro lado, tal movimento transformou o mundo em uma grande massa cultural inglesa que perdura até os dias de hoje, principalmente no continente africano, o que mais teve territórios invadidos pelos britânicos. 

Historicamente, as primeiras colônias britânicas começaram a surgir no reinado de Elizabeth I, durante a expedição da circunferência do Globo pelo navegador Francis Drake, entre 1577 e 1590. Por volta de 1600 surge a Companhia Britânica das Índias Orientais que tinha como objetivo a exploração comercial da Ásia. 

Embora as primeiras colônias tenham surgido no final do século XV, devido ao desconhecimento da região e as dificuldades humanas que isso implica, somente em 1607, no reinado de James I, que o Império conseguiu fundar a 1º colônia na América bem sucedida, onde hoje é conhecido como Jamestown, no estado da Virgínia nos Estados Unidos. Somente em 1670, o Império conseguiu chegar ao que hoje é o Canadá, fundando a colônia de Rupert. Lembrando que o Canadá faz parte da Commonwealth até os dias de hoje.

Até então, o Império era conhecido como Império Inglês, pois se originava apenas no Reino da Inglaterra. Em 1707, portanto, o Reino da Escócia se unificou à Inglaterra surgindo o Reino da Grã-Bretanha, marcando assim o Primeiro Império Britânico.

Essa unificação também fortaleceu o Império que em 1713 conseguiu à Coroa a assinatura do Tratado de Utrecht, colocando fim à guerra contra a Espanha que passou para o Reino da Grã-Bretanha algumas faixas de terras. E é nesse momento, que o Reino se torna a primeira potência comercial da Europa.

Embora tenham fundado a Colônia de Rupert, atual Canadá, houve ao longo de anos a disputa do território com os franceses. Porém, em 1763, sob reinado de George III, os britânicos conquistaram o Canadá para si através do Tratado de Paris. 

E foi no ano de 1776, que as inúmeras colônias na América do Norte que haviam surgido desde 1607, se revoltaram e gritaram a independência da monarquia britânica, surgindo então, uma das maiores potências mundiais atualmente, os Estados Unidos da América. 

Depois de alguns anos, em 1783, começa a fase do Segundo Império Britânico marcando a chegada ao continente africano. 5 anos depois, em 1788, conquistam o leste da Austrália. É nessa fase que o poder da Coroa começa a atingir seu auge, pois foi o período histórico em que o Reino mais conquistou terras. Para se ter ideia, entre 1815 e 1914, o recorte histórico ficou conhecido como o Século Britânico, onde a Coroa conquistou cerca de 26 milhões de km2. Em 1829, 41 anos depois, o já conhecido Reino Unido, conquistou todo o território da Austrália. Ao final desse Século Britânico, em 1914, o Reino Unido alcança seu apogeu territorial sendo dominante em 35 milhões de km2. 

Esse imperialismo só começou a declinar após o fim da Primeira Guerra Mundial que embora o Reino Unido tenha saído vitorioso, foi o start inicial dos movimentos separatistas dos países que ainda estavam sob domínio da Coroa Britânica. Aos poucos, os milhões de km2 ao longo do globo começam a diminuir, até que em 1931, através do Estatuto de Westminster, o Reino Unido reconhece a independência dos domínios e perde cerca de 11 milhões de km2. 

O marco para o fim do Imperialismo Britânico é quando Hong Kong é devolvida para o governo Chinês, em 1947, já sob o reinado de Elizabeth II. 

Após esse breve contexto histórico das forças armadas da Coroa e a colonização ao redor do globo, podemos compreender de fato os impactos culturais que os ingleses acarretaram na formação de milhões de pessoas, sobretudo a população do continente africano, que teve mais territórios colonizados. 

Isso moldou não apenas as culturas de inúmeros povos que até hoje tentam erradicar os arquétipos ingleses de sua população, mas também a imagem da Coroa, que por incrível que pareça, conseguiu esconder o sangue nas mãos e se passar por bons amigos. 

É claro que isso se deve a questões mais profundas, principalmente socioeconomicamente falando. Contudo, não deixa de ser uma relação conturbada politicamente. Dado as últimas fases dos territórios sob domínios ingleses, que se findaram boa parte após a Segunda Guerra Mundial, é muito recente o movimento descolonizalista, o que infelizmente, ainda se molda fortemente a cultura britânica com esses povos.

Em entrevista para o Jornal A Cena com o professor sociólogo Gustavo Biscaia de Lacerda da Universidade Federal do Paraná (UFPR), doutor em Sociologia Política pela UFSC, o mesmo destaca que “o império britânico foi a corporificação do imperialismo britânico, tendo como maior representante a rainha Victoria (1819-1901) que foi uma mulher prepotente, agressiva e expansionista tendo apoiado e estimulado guerras colonialistas. […] No caso do Brasil, o império britânico impôs o fim do tráfico negreiro no século XIX, o que, evidentemente, foi um elemento importante para nós, embora ao custo das maiores prepotências políticas.”

O poder atual da Coroa

Ao longo dos anos, a Coroa britânica começou a despencar em níveis de poder. Boa parte disso se deve ao movimento social em massa que atingiu a Inglaterra também nos séculos passadas que exigia mais autonomia aos cidadãos, principalmente quando os reinos ao redor começam a cair e a se transformarem em repúblicas. Mas como podemos ‘derrubar’ uma monarquia tão sólida culturalmente?

Segundo o professor Dr. Gustavo, “desde meados do século XIX a família real britânica tem cada vez menos importância e poder, na medida em que o poder político foi transferido paulatinamente para o Parlamento e, acima de tudo, para o Primeiro-ministro. A relevância da monarquia é cada vez mais simbólica, no sentido de representar a tradição e a permanência histórica do país – mas, evidentemente, cada vez menos.” 

Isso significa que em breve poderemos ver o desmonte da Coroa britânica, à medida que as novas gerações de ingleses estão cada vez menos adeptos ao movimento monárquico. 

Contudo, talvez isso esteja um pouco longe de acontecer ainda. Isso se deve ao fato de que a Rainha Elizabeth II, que faleceu esse ano, ter sido a monarca mais popular de toda a história do Reino Unido, consolidando, assim, a imagem da família real e o reconhecimento da monarquia como algo importante para o país. 

Além disso, a Coroa britânica segue sendo muito respeitada internacionalmente, como conta o professor Dr. Gustavo: “A monarquia britânica é uma instituição nacional inglesa e, como tal, tem que ser respeitada, da mesma forma que qualquer instituição nacional tem que ser respeitada pelos governos de outros países. Além disso, a importância histórica dessa monarquia em particular e o comportamento austero de Elizabeth II aumentam o respeito. Dito isso, há que se distinguir o respeito devido a uma instituição nacional em particular (a monarquia inglesa) e o respeito a uma instituição que é cada vez mais caduca em geral (a monarquia em geral).” 

Quando questionado sobre quais seriam as explicações para a Coroa Britânica continuar tão forte ao longo de tantos anos, o professor Dr. contrapõe afirmando que “ela (monarquia) não se manteve forte ao longo dos anos. O mero fato de que o rei reina mas não governa já indica que a monarquia não é forte. Estamos muito, muito distantes da época dos grandes reis Tudor (Henrique VIII e Elizabeth I), dos reis Stuarts (Jaime I e II, Carlos I e II, Henrique III) e mesmo da rainha Victoria. O que há é apenas um culto – fortemente midiático – ao mito da monarquia.” 

Na opinião do professor, “a monarquia tem um papel simbólico, ao representar dentro e fora a unidade, a tradição e a história inglesa. Nesse sentido, ela tem um certo papel. Mas esse papel torna-se cada vez mais difuso, na medida em que as monarquias são vistas cada vez mais como dispensáveis, caras e inúteis.”

A exemplo da ineficiência da monarquia atualmente, o professor cita a saída do Reino Unido da União Europeia em janeiro de 2020. Segundo ele, “a monarquia ficou completamente à parte dos debates sobre Brexit. Isso é extremamente ilustrativo da inutilidade, da irrelevância da monarquia. A decisão política, econômica e social da Inglaterra que, de longe, foi a mais importante no último meio século, foi tomada ante uma rainha que assistia a tudo em silêncio e que se limitou a endossar passivamente as turbulências políticas resultantes (no caso, as várias trocas de Primeiro-ministro). E pior, enquanto a Inglaterra era varrida pela onda Brexit e da manipulação midiática promovida pela Cambridge Analytic, com apoio do Kremlin e da extrema-direita mundial, com efeitos imediatos sobre a economia do Reino Unido e sobre a existência do próprio Reino Unido (fronteira entre as Irlandas, aceitação da escócia do Ato de União de 1707, republicanização da Escócia), o que fazia a monarquia? Brincava de fofocas e intrigas entre os casais Guilherme-Catarina e Harry-megan.” 

O professor ainda cita que o mesmo silêncio foi perceptível durante a década de 70 quando Margareth Thatcher impôs violentas políticas neoliberais, destruindo as leis trabalhistas inglesas. 

Uma pesquisa realizada pelo YouGov, um instituto do jornal inglês Daily Star, no início de 2022 apontou que 40% dos britânicos achavam que William deveria ser o herdeiro direto da Coroa. Na avaliação de 14% dos entrevistados, a monarquia deveria chegar ao fim após a morte de Elizabeth 2ª. 

Outra pesquisa realizada pelo mesmo instituto no ano de 2021 apontou que jovens de 18 a 24 anos de idade representam 41% dos que preferem um Chefe de Estado eleito ao invés de um monarca e apenas 31% disseram que apoiam o contrário.

Esse índice vem aumentando drasticamente no decorrer dos anos, principalmente com a mudança e a proclamação do Rei Charles III que sempre foi impopular. 

 

E o que The Crown pode impactar nisso?

A série da Netflix The Crown é considerada uma das mais populares produções já realizadas pela plataforma. Lançada em 2016 e com autoria de Peter Morgan, famoso roteirista inglês, reconhecido por outras obras envolvendo a família real, The Crown possui 5 temporadas, sendo a última lançada no dia 09 de novembro de 2022. 

A quinta temporada recebeu sucesso de crítica e uma avalanche de audiência, principalmente com o recorte histórico da princesa Diana e seu casamento conturbado com o atual Rei. 

Em setembro de 2022, após a morte da Rainha Elizabeth II, protagonista da produção, a série teve um pico de audiência no mundo inteiro de 800%, conforme um relatório divulgado pela Netflix. 

Ao longo das temporadas, a série não mede esforços em nos contar o que aconteceu no dia a dia da história da família de Windsor, sendo mais de 90% fiel aos acontecimentos verdadeiros. Isso também inclui, as desavenças, os escândalos, brigas e até traições entre os membros da família. 

A primeira temporada nos mostra os sérios problemas que a rainha possuía com Churchill. Já na segunda, podemos duvidar da fidelidade do Rei Consorte Phillipe durante seu casamento e desde a terceira temporada temos sentido cada vez mais indisposição com o atual Rei quando passamos a ver o quanto é mimado e insuportável com aqueles ao seu redor. 

A exemplo da dramatização feita na série é que na primeira temporada a disputa entre Michael Adeane e Martin Charteris sobre quem seria o secretário particular da Rainha Elizabeth não ocorreu na vida real. Assim como, a esposa de Winston Churchill, Clementine, não queimou o retrato de seu marido.

Na série, a Princesa Margaret atua como embaixadora da Rainha enquanto ela está em uma turnê pelo exterior, mas os discursos que ela faz são inteiramente fictícios. Além disso, vários detalhes foram acrescentados para tornar a incapacidade de Margaret de casar com Peter Townsend mais convincente. 

Ou seja, nem tudo na série aconteceu de verdade ou da forma como é mostrado. É claro que isso é mais do que natural, afinal de contas estamos falando de uma obra de ficção, porém, o público em geral, consegue fazer esta distinção? 

Mesmo com tantos escândalos mostrados na série e que muitas vezes teve amplitude se comparado com o que aconteceu de verdade, o professor Dr. Gustavo diz que “mesmo que a série invente fatos e diálogos (e, evidentemente, as séries televisivas sempre inventaram diálogos, bem como ações e reações particulares), no conjunto ela é elogiosa para a monarquia. Além disso, o fato é que a monarquia britânica acostumou-se a viver em uma época de forte evidência midiática e de futricas constantes (algo que também é próprio da Inglaterra). Esse aprendizado baseou-se em parte no obsequioso silêncio mantido por Elizabeth II ao longo de seu longo reinado, mas também baseou-se em acostumar-se com as habituais grosserias e manipulações históricas apresentadas pelo cinema e televisão.”

Quanto aos escândalos revelados pela série e seus impactos diretos na imagem da família real, o professor elenca que “a série não revela os escândalos, ela relembra o público. Parece-me que isso tem pouco reflexo efetivo – seja porque é apenas uma série televisa […], seja porque os efeitos reais dos escândalos já ocorreram 20 anos atrás e já foram absorvidos pela população ao longo do tempo.”

Podemos dizer, então, que embora a série mostre diversas situações adversas a boa imagem que a monarquia tenta segurar diante da população, a série não causa tantos impactos assim de maneira efetiva. Isso porque a população inglesa possui, culturalmente, outros olhos quando se trata de seus monarcas, diferente do restante do mundo. 

Outras nacionalidades e que, portanto, estão distantes da realidade cultural britânica, podem ser impactadas diante dos acontecimentos da série, pois não possuem de fato a Coroa como um arquétipo importante para a cultura. Principalmente, quando estudamos a colonização sangrenta o qual a monarquia inglesa foi responsável ao longo de séculos. 

É claro que esse não é o foco da série, mas não é uma coisa que seja passível de separar. Na imagem pública, tudo isso está fortemente ligado. 

Até mesmo a família real assiste ao seriado, talvez por serem fãs do drama ou apenas para ‘monitorar’ o que estão fazendo e dizendo sobre seus nomes. De qualquer forma, o Palacio de Buckingham havia dito há alguns anos atrás que a própria rainha Elizabeth II assistia um episódio por semana aos domingos, mas que após a forma como mostraram a relação de Phillipe e Charles, ela teria se revoltado e deixado de acompanhar o seriado. 

Segundo algumas fontes internas, o próprio Charles havia recomendado a série para sua mãe na época em que ela foi lançada e se tornou popular. 

Isso mostra também como, apesar de tudo, a família real está por dentro do que a série mostra e ao não contestar os acontecimentos distorcidos ficcionalmente, está sendo conivente com esse movimento. Até porque em nenhum momento ela exigiu que a Netflix colocasse qualquer tipo de informação ou aviso nos episódios lembrando o público que se trata de uma ficção. Essa é a maior crítica que os apoiadores da monarquia dizem sobre a série. 

Nesse caso, a Coroa estaria em silêncio, entendendo que seria um ato de ignorar o que realmente está sendo contado na série ou porque está sendo conivente? 

Uma dúvida que talvez nunca saberemos. Mesmo que do ponto de vista cultural inglês, a série não traga tantos impactos negativos, internacionalmente isso pode sim significar o oposto a longo prazo. Ainda mais com a coroação de um rei pouco impopular e não adorado pelo mundo e principalmente por seu próprio reino. 

Exemplo prático disso aconteceu no dia da estreia da nova temporada de The Crown, quando o mundo foi bombardeado de notícias de que o Rei Charles III e a Rainha Consorte Camila – que é menos adorada ainda que o Charles III – foram alvos de um ataque com ovos por um cidadão. Para o professor Dr. Gustavo, isso “pode significar que a população não respeita seus governantes. De maneira mais profunda, isso significa que os atuais reis não conseguem impingir a si a aura sacra que as monarquias sempre desejaram criar para legitimarem-se. Por outro lado, isso indica que os atuais monarcas não são objeto de respeito humano que Elizabeth II angariou para si ao longo do tempo.”

No cenário científico sociológico, nem mesmo há espaço para uma perspectiva positiva do reinado de Charles III. Segundo o professor, “os monarcas ingleses são peças puramente decorativas. Além disso, sua mãe (rainha Elizabeth II) estabeleceu um padrão particularmente claro de neutralidade política que Charles III dificilmente terá condições de mudar (devido às suas próprias fraquezas midiáticas)”. 

Boa parte dessa ‘rejeição’ pública de Charles III se deu na década de 90 depois do fim de seu casamento com a Princesa Diana, Lady Di, como ficou conhecida. Ao longo de sua breve passagem pela família real, Diana conquistou o mundo com seu jeito meigo e humilde. O que claramente Charles III não possui, mesmo que tentasse. 

Após a morte da rainha Elizabeth II, em setembro de 2022, muitos comentários na internet diziam que a verdadeira rainha consorte é Diana e não Camila. Ou seja, há um rei no trono que não é aclamado por seus súditos e uma rainha odiada. Um prato cheio para os movimentos republicanos ingleses. 

Quando questionado se a Coroa inglesa possui perspectiva de longevidade de existência, o professor Dr. Gustavo manifestou-se da seguinte forma: “como comentei há pouco, a rejeição da monarquia pelo casal Harry-megan foi um golpe contra a monarquia. Da mesma forma, os ovos contra Charles III e Camila indicam que eles não gozam de respeito nem admiração popular. A monarquia inglesa está corroendo-se de dentro e de cima. A tendência, portanto, é a sua contestação cada vez mais pronunciada. Entretanto, é necessário notar duas coisas: por um lado, isso só ocorre porque a sociedade moderna, corretamente, rejeita o sobrenaturalismo e as extravagâncias próprias às monarquias e, em consequência, estimula o republicanismo. Mas por outro lado, a permanência da monarquia dependerá da habilidade midiática de seu filho Guilherme ( que por sua vez, é comedido e carrega a aura de sua mãe, a Princesa Diana).”

Sendo assim, a monarquia inglesa pode cair a qualquer momento diante de nossos olhos, o que poderia significar uma nova era política mundial, conforme explica o professor. “Certamente isso estimularia uma excelente e bem-vinda onda republicana, a começar pela Europa, mas com certeza estendendo-se para a Ásia (por exemplo, o Oriente Médio). Essa onda política teria reflexos econômicos, evidentemente, no sentido de que a economia mundial ficaria abalada durante alguns anos. Convém lembrar que, por um lado, a economia é um conjunto de meios pra fins desejados e que, por outro lado, a política é o âmbito em que esses fins são publicamente formulados e implementados. Assim, um abalo econômico durante alguns anos não seria o fim do mundo.” 

Então, podemos concluir que a Coroa está sim se tornando obsoleta a ponto de começar a ser vista com outros olhos, porém, sem qualquer efeito nascido das tramas ficcionais do cinema, do ponto de vista britânico. 

Quanto tempo ainda teremos de reinado de Charles III ou o filho da verdadeira rainha consorte, Lady Di e das incríveis extravagâncias que a monarquia desfruta ainda é um mistério. Seria em um futuro breve ou longínquo?  

 

Texto: Igor Horbach

Entrevistado: Gustavo Biscaia de Lacerda, sociólogo da UFPR, doutor em Sociologia Política (UFSC 2010), tendo pesquisado teoria política e republicanismo.

Referências: 

Quais são as funções do Rei da Inglaterra? | Super

https://www.youtube.com/watch?v=vaDd4-pn49Y

https://www.bbc.com/portuguese/geral-63578233#:~:text=O%20Pal%C3%A1cio%20de%20Buckingham%20disse,jornalistas%2C%20bi%C3%B3grafos%20e%20historiadores%22.

https://www.youtube.com/watch?v=HfigQoXwF3w&t=1307s

https://istoe.com.br/o-que-e-verdade-e-o-que-nao-e-em-the-crown-serie-sobre-a-monarquia-britanica/ 

https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/o-que-familia-real-pensa-sobre-o-seriado-crown.phtml

https://www.youtube.com/watch?v=HHxkcCOk-Hk

https://www.youtube.com/watch?v=nTkyMIaHiJM

https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2022/09/08/com-a-morte-da-rainha-elizabeth-2-monarquia-pode-acabar.htm

https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2022/02/peso-da-monarquia-britanica-na-politica-mudou-e-apoio-caiu-entre-jovens.shtml 

É autor, ator, dramaturgo e produtor brasileiro. Nascido em Tangará da Serra – MT, publicou seu primeiro livro aos 14 anos e o segundo aos 16. Em 2017 se mudou para Curitiba onde iniciou sua carreira de ator, produtor e dramaturgo. Em 2019, produziu e dirigiu a serie Dislike. Em 2020 publicou seu drama de estreia, Cartas para Jack. Em 2021 lançou a série de contos intitulada Projeto Insônia.

Comentar

Responder

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Seja nosso parceiro2

Megaidea