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Tom Jobim Musical, uma celebração ao gênio da Bossa Nova

Trinta anos após sua morte, a trajetória de Jobim é celebrada em uma superprodução teatral

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Trinta anos após sua morte, a trajetória de Jobim é celebrada em uma superprodução teatral

Por Tacy

Classudo! Foi a palavra que me veio à mente ao sair de “Tom Jobim Musical” no Teatro Casagrande, no último fim de semana. Fiquei refletindo sobre como traduzir a intensa sensação que me tomou durante as quase três horas de espetáculo, numa viagem pela trajetória de um dos compositores mais queridos da minha infância. O charme e a autêntica “carioquice” que permeiam a produção deixam claro o cuidado em honrar a obra do gênio Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim. Em cartaz no Leblon até 15 de dezembro, a superprodução de Luiz Oscar Niemeyer, Júlio Figueiredo e Bárbara Guerra reaviva a memória do maestro, inclusive para fãs mais jovens, que, como eu, nunca tiveram a chance de vê-lo ao vivo. A montagem percorre desde a boemia de seus primeiros anos até o auge da Bossa Nova e o impacto de sua música no exterior, além de pincelar aspectos de sua vida pessoal, incluindo
seus relacionamentos e filhos.

No melhor estilo da Broadway, tudo começa com uma abertura instrumental de encher os olhos. A cenografia, criada por Natália Lana e Nello Marrese, alia simplicidade e sofisticação, enquanto a iluminação de Caetano Vilela dá vida a cada detalhe. Antes da cortina revelar o protagonista, vemos Vinicius de Moraes em cena, carismático e conversador, interpretado com naturalidade por Otávio Müller. De início, a entrada do Poetinha causa estranheza, mas logo entendemos que ele é o narrador da saga de Jobim. Quando um jovem Tom se junta a ele no palco, uma parceria se forma, e a interação entre os dois amigos logo cativa o público. Numa prosa sobre o céu e o vento, Tom diz “Acho que o tempo vai virar, Vina”. Ao que Vinicius responde: “Vina? Mas você ainda não me conhece!” e a cena acaba.
Elton Towersey, que vive Tom, capta com delicadeza a diplomacia e o charme característico do maestro. Seu figurino, criado por Theodore Cochrane, reflete a época com primor, especialmente com o terno branco e o icônico chapéu panamá, ajudando a compor a imagem inesquecível de Jobim. O visagismo de Anderson Bueno e Simone Momo são assertivos em envelhecer o ator de forma simples, sem muita maquiagem. As coreografias de Bárbara Guerra completam a estética, valorizando ainda mais o visual impecável, não só do protagonista, mas de todo o elenco.

O roteiro começa pelo começo: o Rio de Janeiro dos anos 50 e 60, quando Tom tocava em pequenas boates, acompanhando cantores da época, como Johnny Alf (interpretado por Felipe Adetokunbo) e Dolores Duran (Analu Pimenta). Os responsáveis pelo texto, Nelson Motta e Pedro Brício, capturam a essência cultural de Tom e nos mostram o homem por trás do maestro, um apaixonado pela natureza e pela vida carioca. A história de seu primeiro casamento com Thereza Hermanny (vivida por Bela Quadros) começa nas areias de Copacabana. A praia, aliás, inspira várias canções de Tom. Ver Helô Pinheiro, a famosa Garota de Ipanema, representada por Carolina Amaral, passeando malemolente pelo calçadão, é como entrar numa máquina do tempo. Outras figuras marcantes, como Ary Barroso (Tiago Herz), Jair Rodrigues (Lucas da Purificação), Elza Soares (Analu Pimenta), Billy Blanco (Vinicius Loyola) e Villa-Lobos (Lucas Corsino), contribuem para o rico mosaico afetivo que o musical cria. Outro ponto importante é o segundo casamento de Tom, com a fotógrafa Ana Lontra Jobim (Estrela Blanco), celebrado no palco ao som de “Pela Luz dos Olhos Teus”. A leveza e o humor são ingredientes presentes na trama, especialmente nos personagens de Vinicius de Moraes, sempre espirituoso; e João Gilberto, interpretado por Jean Amorim, cuja personalidade excêntrica arranca risadas. Em cena, ambos são bons em tiradas e observações cômicas. Além deles, Tom também garante alguma graça, como na divertida cena em que mostra o medo que tinha de aviões, quase cancelando uma apresentação no Carnegie Hall por causa disso. Ao retratar a carreira internacional de Tom, o espetáculo brilha ao reencenar clássicos, como o dueto de “The Girl from Ipanema” com Frank Sinatra, interpretado por Marcel Octávio, que impressiona com sua voz aveludada. Já o emblemático duo “Tom e Elis”, em “Águas de
Março”, é um dos pontos altos, com Thainá Gallo encarnando Elis de forma notável, reproduzindo até o riso espontâneo da cantora. Foi um momento de pura emoção pessoal, confesso.

Ao longo do espetáculo, mais de trinta canções emblemáticas embalam o público, que se emociona com sucessos como “Desafinado”, “Chega de Saudade”, “Samba de uma Nota Só”, “Corcovado”, “Wave” e, claro, “Garota de Ipanema”. Sob a direção musical de Thiago Gimenez, as músicas são executadas com fidelidade, mantendo o espírito original da Bossa. Os arranjos têm a colaboração de Ivan de Andrade e Tiago Saul. A orquestra de quinze músicos
preenche o fundo do palco e traz vida ao som de Tom, numa cenografia imersiva, que amplifica a experiência sonora. E conectando tudo isso num tear cuidadoso, usando de suas conhecidas habilidades em espetáculos biográficos, está a direção de João Fonseca, que conduz a narrativa e a música com sensibilidade, valorizando o homem e o artista que Tom foi.

Depois dos aplausos frenéticos do público e dos agradecimentos, percebi que algumas figuras importantes foram deixadas de fora. Nem Chico Buarque, com quem Tom compôs sucessos como “Sabiá”, nem Gal Costa, que gravou um álbum inteiro de Jobim em 1987, foram mencionados. Apesar da ausência desses nomes, é compreensível que, numa carreira de mais de 40 anos e com uma obra tão extensa, algumas escolhas tiveram que ser feitas. Ainda assim, o que importa é que o “Tom Jobim Musical” é uma homenagem à altura do homenageado: encantador, carismático e, acima de tudo, genial.

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