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Teatro

Um texto para o Dia Internacional do Teatro

Publicado

em

por Leonardo Talarico Marins

No período que parto para me apresentar em Belo Horizonte, o espetáculo Anne Frank, e sigo diretamente em viagem mundo a fora, com indisfarçável necessidade, ressalto breves comentários sobre o nosso mister em confronto à comemoração do Dia Internacional do Teatro. Insta ressaltar que toda homenagem concentrada em um dia acaba por receber esvaziamento ao longo dos demais. Como exemplo, podemos citar o inexpressivo dia internacional do homem e o inexistente dia internacional do entorpecente. Tais exemplo são celebrados em todas as estações. Enquanto os dias de “festividade concentrada” são abandonados dia seguinte. Como o seu aniversário: as pessoas rendem homenagem por atividade social e mês seguinte ninguém sabe seu estado cognitivo. Você é mera lembrança do Facebook. No caso do nosso interesse imediato, as Artes Cênicas, faz-se necessário saber o que celebrar? Quase nada! Há muito trabalho para recuperarmos uma destruição da nobre instituição por inúmeros governos e pela própria classe artística. Portanto, para que esse início de tertúlia não seja no estilo de marcar uma reunião para agendarmos nova reunião, lançarei para discussão uma lista (para mim) imprescindível à retomada das Artes Cênicas na sua real instalação antropológica. Senão Vejamos:

1. Deixarmos o Teatro distante da manipulação política. Devemos exercer a nossa profissão ausente, prima facie, qualquer campo ideológico. Não sejamos utilizados por interesses espúrios.

2. Darmos oportunidade aos novos profissionais, sobretudo por meio das leis de incentivo, para que possamos garantir uma nova geração de operadores cênicos.

3. Que as faculdades cênicas entreguem mais espetáculos e profissionais do que teses de mestrado e doutorado. Os “campus-burgueses” não formam mais atores e atrizes, mas “professores-acadêmicos” formadores de novos “professores-acadêmicos”. Espaços de bolhas ideológicas e Teatros vazios.

4. Compreender que a profissão exercida não nos coloca superior ao restante da população. Debaixo do céu somos todos ignorantes. Portanto, é preciso eliminar a quarta parede repulsiva existente no imaginário artístico.

5. Entender definitivamente que a construção teatral não é campo autorreferente no qual serve para você entremostrar os passos significativos (ou não) da sua vida. Há inúmeros autores, clássicos e contemporâneos, a espera da oportunidade de ter sua dramaturgia levantada.

6. Realizar montagens honestas intelectualmente ao fim dos cursos com esse propósito de formação. Nada mais maledicente do que enganar alunos e alunas com uma apresentação profissional fictícia.

7. Entender que os seus amigos (de classe ou não) não são capazes de aferir sua qualidade cênica. Fuja do estereótipo e também do autoengano.

8. Esqueça o lucro. No presente momento histórico, você não faz Teatro para aferir recursos. Você faz por vocação, se a tiver, senão grave vídeos para o Tik Tok.

9. Que as entidades teatrais alarguem sua representatividade e distribuição de poder. Quem legisla para poucos, legisla para si.

10. Entendimento dos críticos de que não julgam o que gostariam de fazer ou ancorados nos seus gostos pessoais, mas no posto em cena.

11. Obrigação dos jurados de prêmios assistirem a todos os espetáculos teatrais para surgir a honestidade de dizer ser aquela obra a melhor do ano e não a melhor obra que viu ou ainda a melhor obra feita “entre os seus amigos”.

12. Acreditar definitivamente que existe Teatro na baixada fluminense e nas periferias do Brasil a fora.

13. Que os atores e atrizes não abandonem uma obra teatral ao primeiro chamado da teledramaturgia (inclusive as de direita – como a hipocrisia é reveladora).

14. Que os ícones da profissão recebam glória dos prêmios teatrais existentes antes de morrer, como meu pai Amir Haddad. Mas que recebam em dinheiro. Ninguém mais precisa de troféus. Até porque para atingir referido estágio precisaram renunciar à perversa indústria financeira de há muito alocada na mão de meia dúzia de seis.

15. Eliminar de todos os setores teatrais a palavra (e comportamento) hipocrisia e corrupção.

16. Vergonha na cara das “empresas investidoras”. As leis de incentivo servem para vocês estimularem pesquisas e desassistidos, e não agregar valor com celebridades.

17. Realize a obra da sua vida. Aquele assunto ou texto que você necessita dizer em primeira pessoa. Só assim você conseguirá entregar todos os recursos necessários à realização digna. Fale em primeira pessoa!

18. Fundamental cercar-se de pessoas com o mesmo propósito artístico de servir à plateia. Se você ou qualquer outro membro da sua equipe não estiver orientado ao público, o espetáculo é mero ato exibicionista. O Teatro precisa revelar e acrescer vida à plateia de forma horizontal. É preciso expurgar a verticalização presente nos palcos.

19. A melhor definição de homem (ser humano) é que “o homem é aquele que esquece”. Esquece o quê? Os elementos estruturais da vida humana, como a honra, a morte, os valores antropológicos etc. Por decorrente, atores e atrizes são “ninfas”, com a obrigação de relembrar e articular esses conceitos para que sejam rememorados pela sociedade. Portanto, novamente, esteja a serviço. Tudo pelo Teatro. O Teatro não te deve nada. Você, sim, é devedor. Deve aos primeiros passos dados no palco, aos estudos humanos e, sobretudo, a todos os demais saberes, haja vista que a medida do artista é a medida do humano e todas as ciências, de uma forma ou de outra, colaboraram com o feito teatral.

20. Dane-se o Dia Internacional do Teatro. Dia do Teatro é de quinta a domingo. Infelizmente, pois outrora era de segunda a domingo. Hoje, é no dia 27 de abril. Portanto, deixemos de ser tontos. Não se comemora redução de importância.

 

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