Teatro
Reviver Tom na Fazenda em Curitiba é reencontrar a grandeza do teatro
É impossível não tecer elogios a esse elenco, que conduz a plateia pela trama com intensidade, como se, em muitos momentos, olhasse nos olhos do público para compartilhar cada dor, cada segredo e cada silêncio, tornando a experiência ainda mais única.

por Diogo Marcelo
Assistir Tom na Fazenda de novo, depois de tantos anos, foi sem dúvida uma das melhores experiências de 2025. Minha primeira oportunidade foi em 2018, no início da minha Licenciatura em Teatro, na Faculdade de Artes do Paraná, eu ainda engatinhava nos estudos, sedento por aprender, por conhecer. Mesmo com esse pouco tempo de estrada, a peça me marcou profundamente; ficou viva na memória como algo surpreendente, envolvente do começo ao fim.
São cerca de 90 minutos (e não mais os 120 de que me lembrava!) de espetáculo, mas cada segundo parece durar o bastante para penetrar na alma. E se ao fim não fossem os aplausos, longos e absolutamente merecidos, acho que ficaria sentado por horas tentando reviver cada cena, cada movimento, cada luz. A iluminação, a cenografia, as atuações, o texto, tudo perfeito. E a direção de Rodrigo Portela, então, linda: com um equilíbrio raro entre força dramática e sensibilidade.
Quando, em 2018 no Festival de Curitiba, Tom na Fazenda já vinha de grandes expectativas: sucesso de público, indicações a prêmios. Agora, essa nova temporada chega carregada de reconhecimento internacional, especialmente após sua circulação no Festival Fringe de Edimburgo, onde se consolidou como peça brasileira de relevância e força. (Jornal a Cena)
No palco, temos Tom, vivido com intensidade por Armando Babaioff, um publicitário que viaja à fazenda da família de seu companheiro, recém-falecido, para o funeral. A tensão se estabelece logo de início: a mãe, interpretada com brilhantismo por Denise Del Vecchio, desconhecia o relacionamento do filho e aguardava, na verdade, a chegada de uma suposta namorada, Helen, defendida com sensibilidade e graça por Camila Nhary. O cunhado, por sua vez, é encarnado com vigor por Iano Salomão, sustentando a atmosfera de silêncio, opressão e manipulação que sufoca Tom pouco a pouco.
É impossível não tecer elogios a esse elenco, que conduz a plateia pela trama com intensidade, como se, em muitos momentos, olhasse nos olhos do público para compartilhar cada dor, cada segredo e cada silêncio, tornando a experiência ainda mais única.
Críticas internacionais ressaltam como a montagem brinca com extremos: humor ácido, brutalidade, ternura. Tudo isso num contraste que não deixa o público relaxar. Mark Fisher, do The Guardian, chamou-a de “impressionante estudo sobre a homofobia, tão cruel quanto hipnotizante”. Allan Radcliffe, do The Times, realçou a sensibilidade da produção brasileira em lidar com os conflitos morais e afetivos do texto. (Jornal A Cena)
Hoje, já formado, vejo melhor a grandeza dessa obra. Entendo o quanto ela vai além de um grande espetáculo: é um trabalho que precisa ser visto por muitos, por todos que se permitem ser tocados pela arte. E, para mim, com minha memória afetiva, fica impossível escrever sem parcialidade, mas creio que é impossível também discordar: Tom na Fazenda é uma obra intocável.
Se você está em Curitiba, não perca esta oportunidade. A peça segue em cartaz com suas últimas apresentações no Teatro Guairinha nos próximos dias, às 20h30,. Classificação indicativa 16 anos. É uma chance de ver (ou rever) uma história poderosa, dolorosa, que permanece relevante, inclusive no eco dos aplausos. Como diria uma grande amiga minha: seria uma besteira o público curitibano perder mais esta oportunidade de vivenciar essa história.
Foto: Lee Yung Kim