Interaja conosco

Festival de Curitiba

“Brilho Eterno” – Uma Homenagem Cômica e Contemporânea

Se, por um lado, a não linearidade exige atenção, por outro, ela preserva o charme da narrativa original, transformando o espectador em cúmplice da reconstrução afetiva.

Publicado

em

Foto: Annelize Tozetto

por Vanessa R Ricardo

Como fã de cinema e teatro, sempre me encanto com adaptações que reinventam obras icônicas. *Brilho Eterno*, espetáculo assinado por Jorge Farjalla, se apresenta como uma “homenagem” ao filme *Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembrança* (2004), mas as semelhanças são inegáveis — e, em muitos aspectos, enriquecedoras. O longa de Michel Gondry, que marcou uma geração com sua narrativa não linear e poética sobre amor e esquecimento, inspira aqui uma releitura cômica e feminista, destacando-se pela força da protagonista e pelo tom leve que contrasta com a melancolia do original.  

O mote central permanece: a decisão de apagar as memórias de um relacionamento turbulento. Porém, a peça subverte a passividade de Clementine (do filme) ao entregar a Celine, interpretada por Tainá Müller, uma presença cênica decidida e complexa. A construção da personagem, fruto da colaboração entre Müller, Farjalla e o dramaturgo André Magalhães, é um acerto. Celine ganha protagonismo e um olhar contemporâneo, reflexo de uma mulher que, mesmo fragilizada pelo amor, não se reduz à mera vítima.  

A opção pelo humor é a grande surpresa. O trio Wilson de Santos, Fábio Ventura e Tom Karabachian, como os “doutores” responsáveis pelo procedimento de apagamento, rouba cenas com um alívio cômico que dilui a densidade do tema sem banalizá-lo. A direção parece consciente de que, no palco, a leveza pode ser tão potente quanto o drama — e essa escolha revitaliza a história.  

A estrutura fragmentada, tal qual no filme, convida o público a montar o quebra-cabeça das memórias de Celine e Joel, interpretado por Reinaldo Gianechini . Se, por um lado, a não linearidade exige atenção, por outro, ela preserva o charme da narrativa original, transformando o espectador em cúmplice da reconstrução afetiva.  

Pequenas ressalvas: em certos momentos, o ritmo oscila, e as referências muito explícitas ao filme podem deixar a desejar em criatividade. Ainda assim, o espetáculo se justifica como homenagem — e, principalmente, como uma reinvenção válida, que honra a fonte sem se tornar refém dela. Brilho Eterno brilha justamente por equilibrar reverência e ousadia, provando que algumas histórias merecem ser revisitadas — e até riscadas — mais de uma vez.  

Brilho Eterno traz no elenco Tainá Müller, Reynaldo Gianecchini, Wilson de Santos, Renata Brás, Fábio Ventura e Tom Karabachian. 

Seja nosso parceiro2

Megaidea